sexta-feira, 20 de abril de 2012

Poesia de São João da Cruz: poeta, místico, teólogo, carmelita e doutor da igreja.

A Noite Escura
São João da Cruz (1542-1591)

O Cristo de São João da Cruz, de autoria do pintor Salvador Dali

Em uma noite escura
de amor em vivas ânsias inflamada
ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
já estando minha casa sossegada.

Na escuridão segura,
pela secreta escada, disfarçada,
ditosa ventura!
Na escuridão, velada,
já estando minha casa sossegada.

Em noite tão ditosa,
e num segredo em que ninguém me via,
nem eu olhava nada,
sem outra luz, nem guia,
além do que no coração me ardia.

Essa luz me guiava
com mais clareza que a do meio-dia,
aonde me esperava
que eu bem conhecia,
em sítio onde ninguém aparecia.


Ó noite que me guiaste,
ó noite mais amável que a alvorada,
ó noite que justaste
amado com amada
amada já no amado transformada.

No meu peito florido
que inteiro só para ele se guardava,
quedou-se adormecido...
E eu, terna, o regalava
e com o leque dos cedros o refrescava.

Da ameia, a brisa amena,
quando eu os seus cabelos afagava,
com sua mão serena
em meu colo soprava
e meus sentidos todos transportava.

Esquecida, quedei-me,
o rosto reclinado sobre o amado,
cessou tudo e abandonei-me,
largando meu cuidado,
por entre as açucenas olvidado.

texto de autoria de São João da Cruz,
Obras Completas de São João da Cruz, Editora Paulus.

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